segunda-feira, 13 de agosto de 2007

O ELEMENTO HUMANO

Chega de migalhas! O tempo não me dá direito a elas e nem as quero. A criança de ontem que se contentava com tão pouco, despertou adulta hoje e quer caminhar com as próprias pernas.

Chega de fragmentos! Tudo o que quero é o “tudo”. O tudo que ao mesmo tempo é o nada. O nada e o tão pouco, mas que pode completar vidas, construir destinos e realizar sonhos.
Chega de beijos de olhos abertos nos momentos bons. Nos maus momentos eu também preciso deles.

Chega de mistificações! A única coisa que quero é ser eu mesmo e esquecer meus personagens. O fraque do ilusionista já está muito desbotado. Não há mais coelhos na cartola e nem cartas na manga. A maquiagem branca já não esconde as rugas do velho palhaço que não sabe mais contar piadas. As sábias palavras do poeta já não inspiram sussurros na lua e nem lágrimas no sol. Chega de brincar de mestre dos bonecos! O teatro da vida é duro e diferente, muitas vezes absurdo e ilusório.

Chega de compartilhar apenas sorrisos, quero também compartilhar lágrimas. Quero seca-las do teu rosto e quero que seque as minhas. Não quero apenas cantar minhas canções, quero também ouvir as tuas e se quiseres e eu também, cantaremos juntos. Não quero apenas ouvir tuas poesias e palavras doces, quero também ouvir os lamentos e as amarguras da tua vida.

Chega de presentes caros nas festas! Quero apenas uma florzinha amarela num dia de domingo à tarde e um beijo de bom-dia na segunda de manhã. Não estarei contigo apenas nos momentos de tua alegria, na tristeza também estarei perto, tão perto que poderás chorar no meu ombro o quanto quiseres e se não quiseres chorar, entenderei que às vezes temos que chorar sozinhos.

Não te condenarei quando demonstrar que não compartilhardes de minhas idéias, pois cada um de nós é uma estrela e cada estrela brilha no seu céu. Não quero te acorrentar ao meu destino e quando partires em busca dos teus sonhos, quem serei para julgar-te certo ou errado? Quem eu serei para acusar-te de egoísmo? Egoísta eu serei se fizer isso! És uma estrela, e como tal, tens um céu para governar...

Não pedirei nada que não quiser me dar. Esperarei tranqüilo dentro da crisálida prateada o momento do despertar e alcançar os ventos outonais. Não me ofenderei e nem te ofenderei quando quiser partir e tu não deixar! Às vezes uma estrada surge em nossa frente e com os pés descalços e feridos por espinhos, devemos caminhar até a encruzilhada sob os salgueiros e escolher um caminho. Minha estrada já não tem tantos caminhos, cansei-me das curvas, cansei-me das idas e vindas, cansei-me dos atalhos que nos deixam ainda mais longe do paraíso.
Cansei de ouvir que todos homens deveriam ter cabelos compridos e todas as mulheres serem independentes. Cansei de ouvir que todos homens deveriam ser fortes e todas as mulheres magras. Como é bom não ser como Pedro, João ou José. Como é bom não ser como Maria, Teresa ou Lúcia. Como é bom ter nossa própria loucura, nosso próprio modo de falar, nosso próprio jeito de se vestir e andar, nosso próprio sonho. Tudo que é próprio é muito bom, quer seja mau ou quer seja bom.

Cansei de dançar no mesmo ritmo de músicas invisíveis, danço seguindo as batidas do meu coração e cada coração bate de um jeito. Cansei de pedir, cansei de dar. Nada é tão dado. Nada é tão incondicional. Amor incondicional? Paixão contida. Do que vale ser um gênio dentro da lâmpada? Pra quê decifrar o enigma da esfinge, quando o bom seria ser devorado por ela?

Como é bom ser uma metamorfose entrando em metástase na alma, pois chegará o dia que as portas serão abertas e as janelas quebradas, e o pássaro amarelo será liberto de seu cativeiro para perecer no sereno da noite de inverno. Isso é loucura incondicional! Loucura incondicional? Uma desculpa que esconde o medo de sermos nós mesmos. O medo de conhecermos como somos. É muito fácil ser louco, pois o sol nasce para todos. É muito fácil ser racional, pois as estações mudam! Somos inferiores aos deuses, pois eles são os senhores de seu próprio destino, mas também somos superiores a eles, pois enquanto eles permanecem imutáveis desde o início dos tempos, nós homens mudamos a cada onda e a cada brisa.

Chegará o dia em que nossos sorrisos não esconderão mais nossas dores e neste dia não quero que vertas tuas preciosas lágrimas em minha homenagem e não quero ver-te de joelhos pedindo o bálsamo para minhas feridas ao mundo. Não quero que desconhecidos meus e teus, me abracem solidariamente quando estiver morrendo e não quero que na tua morte, seja consolado por um melhor amigo.

Ninguém me conhece tanto e nem conheço ninguém o bastante para considera-lo como “meu melhor amigo”. O melhor de se ter um melhor amigo, é que assim saberá quem te trairá primeiro. Alguns com um beijo, com frases lisonjeiras e outros, com um punhal. Prefiro um punhal cravado no peito e não palavras vis sussurradas por língua-de-serpente e beijos frios.

Como seria bom morrer em paz sem ver a dor nos olhos daqueles que ficarão, pois chegará o tempo em que o mesmo portal que me viu entrar me verá sair e aí sim saberemos quem somos e o que somos. Vendo tudo de fora, aí sim entenderemos por que o elemento humano é algo tão incompreensível aos olhos que não enxergam. Aí compreenderemos por que somos semelhantes aos deuses e ao mesmo tempo tão diferentes destes. Aí veremos os dois lados da moeda e também sua extremidade e, justamente, nas pequenas extremidades é que veremos o verdadeiro elemento humano, este que se manifesta nas coisas mais pequeninas e desinteressantes que nunca damos uma real importância.

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